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Síndrome do impostor: como fui uma fraude por 20 anos sem ser descoberta

A Síndrome do Impostor é tratada por algumas pessoas como um mito ou até como tabu, muito em função do receio de se tornarem vulneráveis ao expor suas fraquezas diante dos outros.

Não é de se espantar. Especialmente nas redes sociais, o que mais vemos são sorrisos e celebrações de conquistas — momentos que, muitas vezes, ocultam bastidores bem distintos. Contudo, acredito que, quando expomos nossos problemas e fragilidades, podemos atuar como referência para aqueles que estão sofrendo o mesmo problema e se sentem sozinhos. 

Eu venho lidando com a Síndrome do Impostor há muitos anos e percebi que, quando decidimos compartilhar o que sentimos, conseguimos não só nos ajudar como também colaborar com pessoas que estão vivendo situações semelhantes.

Por isso, resolvi escrever este post e falar um pouco sobre essa condição e a minha experiência pessoal como uma “fraude” ao longo do tempo. Acompanhe!

Afinal, o que é a Síndrome do Impostor?

Essa é uma desordem psicológica que tende a se manifestar no ambiente de trabalho e pode acometer pessoas de diversas áreas de atuação — especialmente mulheres, por uma questão cultural. 

Quem apresenta esse quadro é incapaz de reconhecer suas realizações como fruto de suas skills pessoais e de seu esforço. Muito pelo contrário: estão sempre buscando justificativas externas para acontecimentos positivos em suas vidas. Entram aqui os argumentos de sorte, ajuda de terceiros ou até intervenção divina.

O problema é que, com o passar do tempo, a ausência do sentimento de pertencimento e a recusa em acreditar na própria competência podem fazer com que a pessoa se sinta paralisada até mesmo biologicamente para seguir em frente.

Diante desse cenário existem 2 caminhos: aceitar que é impostor e deixar os sonhos irem por água abaixo ou usá-lo como motivação para se desenvolver e se preparar para os desafios. O quanto antes você detectar a presença do quadro, mais rápido vai poder agir para revertê-lo.

Quais são os sinais dessa síndrome?

Para detectar a síndrome, é preciso conhecer alguns de seus sinais. Destacam-se aqui: 

  • ansiedade, dúvidas e insegurança quanto às próprias capacidades;
  • sentimento de não merecimento do posto ou do cargo ocupado;
  • práticas de autossabotagem;
  • elevada dependência da aprovação externa;
  • desqualificação dos feitos pessoais como sorte ou oportunismo;
  • indícios físicos como sudorese, tremor e gagueira.

Vale destacar que o acompanhamento com um psicólogo pode ser de grande auxílio para avaliação do quadro. Mas o exercício de autoconhecimento, meditação, Yoga, coaching e até o suporte de pessoas queridas e amigas também podem lhe ajudar a superar esses momentos.

Como eu lidei com a Síndrome do Impostor?

Sim, eu vivi com a Síndrome do Impostor por muitos anos. Hoje estou mais madura, experiente e aprendi a lidar com a condição. 

Mas não foi sempre assim… houve um momento na minha vida que não sabia do que a síndrome se tratava. Fui tomada por uma grande ansiedade, que me levava a sofrer física e emocionalmente. Me senti dessa forma por muito tempo: um patinho feio, um peixe fora d’água, um elemento que não combinava com decoração.

No processo de mudança para a penúltima empresa que trabalhei, o quadro se agravou. Atuei ao lado de pessoas altamente qualificadas, muito bem formadas, de classe média-alta, que vinham de famílias abastadas e tinham vasta experiência ao redor do mundo. Aliás, “ter as melhores pessoas” era um dos valores da organização.

Eu olhava para o lado e via profissionais fantásticos, que admirava muito. Mas sempre pensava se eu também merecia estar lá. Foi o ápice de insegurança na minha carreira.

Justificativas

Nesse jogo de privilégios, eu busquei várias justificativas de fatos ocorridos na minha vida que sustentavam a síndrome.

Esses pensamentos, como você pode imaginar, me levaram à autossabotagem e ao boicote. Mas esse é um processo de dentro pra fora e, quem me via, provavelmente não sabia o quão intenso era o que eu estava sentindo.

Até porque, eu consegui manter boas entregas, mas sentia que precisava de mais esforço para chegar no mesmo lugar que os outros funcionários. É como se meus pares estivessem disputando uma corrida de 100 metros e eu uma maratona.

Trajetória

Quando entrei no meu penúltimo emprego, preferi assumir o cargo de consultora do que gerente, por mais que tivesse menos benefícios. Ou seja, ajudei a me sabotar para entrar em um nível abaixo do que eu poderia. 

Por um lado foi até bom, pois pude aprender muito. Talvez, se tivesse ingressado como gerente, não teria conseguido manter o mesmo ritmo, considerando que essa é uma atuação mais complexa.

O que eu fiz, então, foi buscar meios de suprir o que eu considerava que me distanciava dos meus colegas de trabalho. Investi no desenvolvimento técnico e aprimorei minhas soft skills

Lembra na história da maratona? Pois bem, eu virava a noite estudando os materiais presentes na base de conhecimentos da empresa, mesmo sendo todos em inglês (obrigada, Google Translator) e eu tendo uma conexão discada em casa. Às vezes ia trabalhar sem dormir, mas me sentindo um pouco mais segura do meu potencial.

Em paralelo, passei a desenvolver meus pontos fortes. Após conhecer a teoria de Marcus Buckingham, percebi que essa era uma ótima maneira de potencializar o talento e ganhar autoridade em algumas áreas. Realizei o teste presente no livro desse consultor e, entre as 34 competências listadas, as que se destacaram no meu perfil foram: 

  • Comunicação; 
  • Positivo; 
  • Estratégico; 
  • Restauração; 
  • Carisma.

Foi aí que me dei conta que eu estava no caminho certo. Como trabalhava em um meio no qual comunicação era a principal ferramenta, comecei a explorá-la cada vez mais. Assim, consegui conectar dificuldades e aprendizados e evoluir no que tenho de bom.

Resultados

Analisando minha trajetória de forma racional, posso ver que mesmo em meio a obstáculos (inclusive aqueles criados pela minha mente), não deixei o medo me paralisar. Prova disso foi o fato de, em 20 anos, eu ter obtido apenas 2 avaliações na média e as demais todas em níveis superiores.

Fui rapidamente promovida a gerente e, em menos de 2 anos, cheguei ao nível de Sr. Manager (cargo cujo step comum era de 3 anos). Com 7 anos de empresa me tornei sócia-diretora e liderei para América Latina. 

Esse foi um período em que, novamente, me sabotei. Eu estava grávida, de licença maternidade, e acompanhando meu pai que estava internado com câncer. Inicialmente recusei a participar da seleção para a posição, mas meu líder insistiu que me aplicasse e, em função do meu potencial e performance, consegui a vaga.

Isso me fez perceber que o talento também tem forte relação com a nossa atitude, com o querer, poder e saber. Minha realidade pouco privilegiada pode até ter me deixado para trás na largada, mas me deu musculatura para seguir em frente e segurar a onda.

Todo esse esforço me remete muito a minha mãe, que sempre me incentivava e dava forças para correr atrás dos meus sonhos. Pra ela, desistir nunca foi uma opção — e eu acabei absorvendo muito dessa visão.

Hoje, vejo como é libertador falar abertamente sobre a Síndrome do Impostor. Ela ainda costuma bater à minha porta em alguns momentos, mas consigo agir de forma muito mais racional diante da situação. O segredo é fazer da “farsa” uma amiga, utilizando-a para nos impulsionar, e não para estagnar.

E se quiser saber mais sobre o tema, minha experiência e conferir algumas dicas de como lidar com a Síndrome do Impostor — seja como indivíduo ou como empresa —, sugiro que assista à minha palestra no Epicentro 2020

Espero que essa reflexão agregue a sua vida pessoal e você possa aplicá-la, também, para apoiar seus pares. Ser sensível para entender se estão vivendo esse momento e ajudar a passar por ele é uma iniciativa de extremo valor. 

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